A Medicina Tradicional Indígena e os Remédios do Mato


O Brasil é um país multicultural, pois reúne em um só lugar culturas de vários povos. Os povos nativos, da floresta, aborígenes ou indígenas (como quiser denominar) são um dos que melhor representam a cultura brasileira. Além da linguagem, uma das características mais marcantes em nós é a prática da cura natural. Herança, sobretudo, do nosso povo nativo, mas infelizmente, nem todos valorizamos esse conhecimento ancestral.

A cura natural, os nossos remédios do mato fazem parte daquilo que alguns denominam Medicina Tradicional Indígena.

A Medicina Tradicional Indígena é um conjunto de práticas e conhecimentos desenvolvidos por diferentes povos indígenas, para tratar doenças e promover saúde e bem-estar. Trata-se geralmente de um conhecimento sobre a cura, baseado na relação entre corpo, mente, espírito e meio ambiente.

Práticas da Medicina Tradicional Indígena

A Medicina Tradicional Indígena inclui uma ampla gama de práticas, como:

  • o uso de plantas medicinais (os remédios do mato)
  • terapias energéticas
  • rituais de cura
  • aconselhamento espiritual

Essas práticas são passadas de geração em geração e estão enraizadas nas antigas tradições e culturas de cada povo indígena.

O que são os remédios do mato?

Os remédios do mato são plantas e ervas medicinais tradicionalmente utilizadas por povos e comunidades indígenas para tratar diversos tipos de doenças.

Essas plantas possuem propriedades terapêuticas que podem ser úteis no tratamento de doenças comuns como gripes, resfriados e dores de cabeça, a doenças mais graves como diabetes, hipertensão e até mesmo alguns tipos de câncer.

As plantas podem ser consumidas de diferentes formas: em chás, tinturas, pomadas e compressas.

Quais são as plantas medicinais indígenas mais famosas ou usadas

Existem diversas plantas medicinais que são amplamente utilizadas pelos povos indígenas, por suas propriedades terapêuticas. Algumas das mais conhecidas e utilizadas são:

Arruda

Muito usada no tratamento de varizes, pois fortalece os vasos sanguíneos, além de poder ser utilizada para os casos de ansiedade, sendo um ótimo calmante natural. Esta erva tem propriedades analgésicas, antiasmáticas e antiespasmódicas. Também combate piolhos, pulgas e vermes.

Catuaba

Um bom remédio afrodisíaco para resolver problemas de disfunção masculina. A planta aumenta a libido e estimula o sistema nervoso central, sendo usada contra insônia e descontrole emocional. Funciona como energético natural e alivia os sintomas da depressão.

Boldo

O boldo é uma das plantas medicinais indígenas mais populares. Essa planta tem diversas propriedades medicinais que auxiliam no tratamento da má digestão, males do fígado e dor de barriga.

É consumida principalmente na forma de chá, tendo um gosto amargo, mas com efeito imediato. O gosto amargoso facilita o trabalho da vesícula biliar, que estimula a secreção da bílis para a digestão de gorduras.

A planta pode ser usada também no combate de gases intestinais, insuficiências hepáticas, como analgésico e como protetor estomacal.

Açaí

O açaí é uma fruta rica em antioxidantes e nutrientes, utilizada para combater o envelhecimento precoce e fortalecer o sistema imunológico.

Guaraná

A semente de guaraná é utilizada como estimulante natural, aumentando a disposição e a energia.

Babosa

A babosa, Aloe vera, é utilizada para tratar queimaduras, irritações na pele, feridas e inflamações.

Cipó-cravo

O cipó-cravo (Tynnanthus fasciculatus) é utilizado para tratar problemas como asma, bronquite e tosse.

Erva-mate

As folhas de erva-mate são utilizadas como estimulante, diurético e laxante.

Jaborandi

O jaborandi é utilizado para tratar problemas de visão como o glaucoma, além de ser um estimulante para o crescimento capilar.

Unha-de-gato

Utilizada como anti-inflamatório natural para tratar problemas articulares e inflamações em geral.

Salgueiro

O salgueiro tem como princípio ativo o ácido salicílico e é usado para tratar mal-estar, febre e reumatismo.

Dedaleira

A planta dedaleira (Digitalis purpurea) tem como princípio ativo a digoxina. É usada para distúrbios na circulação do sangue que causam insuficiência cardíaca e arritmia.

Cinchona

Este gênero de plantas é comum na América do Sul e tem como princípio ativo a quinina. É usada como antitérmico na redução da febre.

Saratudo

A planta saratudo (Justicia calycina) é usada como chá para tratar inflamações. Trata problemas como  dor de estômago, gastrite, distúrbios do fígado, disfunções na próstata e feridas.

Mastruz

O mastruz é uma erva bem popular, principalmente em comunidades rurais. Serve para tratar verminoses, gripes e inflamações.

Graviola

A graviola (Annona muricata) é utilizada para combater vômito, diarreia, moleza e corpo doído.

Mandacaru

O mandacaru é uma cactácea nativa do Brasil, pertencente ao gênero Cereus. Esse cacto é utilizado para sanar problemas renais, gastrites e combater a dor e regular o colesterol.

Pau d’arco roxo

O pau d’arco roxo (Handroanthus impetiginosus), também conhecido como ipê-roxo trata câncer, inflamação, anemia, problemas no útero e infecções.

Barbatimão

O barbatimão (Connarus perrottetii) possui ação cicatrizante, anti-inflamatória e antioxidante, pode ser utilizado para a cicatrização de feridas, queimaduras, infecções de pele, hematomas, dermatite, frieira ou pé diabético. Também combate corrimento vaginal.

Embaúba

© WIKIAVES

© WIKIAVES

Embaúba é o nome popular de árvores do gênero Cecropia. Todas as partes da embaúba podem ser utilizadas para preparar sucos ou chás. Porém, é mais comum utilizar as folhas. Esta planta tem propriedades cardiotônica, diurética, anti-hemorrágica, adstringente, antiasmática, analgésica, antisséptica, cicatrizante, expectorante e hipotensora.

Atenção – não se automedique

É importante lembrar que o uso dessas plantas medicinais deve ser feito com orientação e supervisão de um profissional da saúde, já que a dosagem e o modo de uso podem variar de acordo com cada caso.

Pesquisa brasileira

Uma pesquisa brasileira constatou que a Medicina Tradicional Indígena foi mais eficaz do que remédios convencionais no tratamento da dor entre membros das tribos do Vale do Javari, no oeste do Amazonas.

A pesquisa que foi realizada pela mestra em enfermagem Elaine Barbosa de Moraes, para o Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein com apoio da Fapesp, constatou que, ainda que os chamados “remédios do branco” sejam utilizados por 86,7% dos indígenas que ela entrevistou, as drogas só acarretaram alívio para 22,2% deles.

A pesquisadora ouviu 45 indígenas das etnias marubo, canamari e matis, dos quais 80% recorreram à Medicina Tradicional Indígena para o tratamento da dor e 64,5% confirmaram a eficácia desse método.

“Fica bem evidente que, mesmo utilizando mais a medicina convencional, o alívio da dor vem mais com o uso do remédio da Medicina Tradicional Indígena”, concluiu Elaine.

Enquanto realizava essa pesquisa, Elaine enfrentava uma LER (lesão por esforço repetitivo) nos braços. Um problema que perdurava havia cinco anos, com pouca melhora mesmo fazendo uso de anti-inflamatórios e compressas geladas.

Uma das mulheres da aldeia então aplicou na região dolorida uma resina chamada breu-branco, extraída da árvore de mesmo nome e misturada com urucum. Este remédio foi preparado pelo pajé, que cantou durante horas a fim de ativar seu efeito.

Três dias depois, a dor no braço de Elaine desapareceu e o efeito se prolongou por quatro meses.

Esta experiência pessoal de Elaine reforçou os dados de sua pesquisa e apontou para a necessidade de se criar um diálogo entre as medicinas convencional e a indígena, o que seria bom para todos.

“Nós, brasileiros, não valorizamos um conhecimento ancestral que é nosso. No caso dos tratamentos chamados alternativos, aceitamos a medicina chinesa e pagamos caro por ela, mas pouco sabemos sobre as terapias indígenas”, afirmou a enfermeira, que é pesquisadora e professora da unidade de Manaus da Unip.

“No Brasil, parece que os índios nem existem. Muitos remédios alopatas advêm de produtos que eles utilizam e nos esquecemos dessa riqueza abandonada à biopirataria. É preciso aliar conhecimentos para melhorar o atendimento aos índios e estudar que práticas deles podem ser inseridas com segurança em outros contextos. Para os dois lados essa integração seria importante”, defendeu.

Trabalho científico

O trabalho científico Plantas medicinais usadas pelos índios Tapebas do Ceará fez um levantamento das plantas medicinais utilizadas por esses povos para resgatar a cultura descaracterizada ao longo dos anos.

Foram feitas entrevistas nas comunidades localizadas no município de Caucaia, situado a 16 Km de Fortaleza, capital do Ceará, em que foram mencionadas 63 plantas usadas pelos indígenas.

As plantas mais citadas foram analisadas e agrupadas de acordo com seus dados químico, farmacológico e ou toxicológico encontrados na literatura científica.

A pesquisa mostra que a comunidade indígena dos Tapebas faz uso de muitas espécies vegetais sem dados químico e farmacológico registrados, bem como de outras que já foram alvo de pesquisa científica, mas que necessitam ainda de estudos complementares para garantir segurança para um uso geral e preparação de fitoterápicos.

Esse trabalho coletou e apresentou algumas das principais plantas medicinais indígenas e suas propriedades, o que pode ampliar as alternativas de tratamento de inúmeras doenças.

Respeito à sabedoria indígena

Como visto, as tradições indígenas contêm um gama de valiosos conhecimentos  que precisam ser mais valorizados e exaltados. Para isso, é fundamental respeitar a sabedoria dos povos indígenas, bem como suas práticas de cura, reconhecendo a importância da preservação e promoção de suas tradições.

Fontes:

  1. Boa Saúde
  2. Agência Brasil
  3. Folha de São Paulo
  4. Bem Paraná
  5. Scielo-Brasil – Plantas medicinais usadas pelos índios Tapebas do Ceará
  6. Super Interessante
  7. UFPA – Etnobotânica em duas Comunidades da Terra Indígena São Marcos-Roraima, Brasil

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Deise Aur

Professora, alfabetizadora, formada em História pela Universidade Santa Cecília, tem o blog A Vida nos Fala e escreve para greenMe desde 2017.


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