Coronavírus: caos na Itália sugere que não sabemos lidar com epidemias


Embora o coronavírus não possa ser considerado, ainda, o causador da pior epidemia já vista nos últimos anos, a forma como ele se comportou na China e, agora, na Itália, pode ser um indicativo de que temos muito com o que nos preocupar.

Primeiramente, porque, no caso da Itália, o sistema de saúde público funciona de forma muita eficiente. Se pensarmos que há países sem essa infraestrutura ou sem um sistema público, como os Estados Unidos, muitas pessoas podem ser vítimas da covid-19, sobretudo, os idosos.

Itália em estado de sítio

A situação na Itália é o que se chama de estado de sítio: a população está impedida de ir e vir dentro de seu próprio país. Escolas, museus, teatros, academias de ginástica, cinemas estão fechados. A locomoção só pode ser feita se apresentada alguma justificativa, de acordo com um decreto de segurança sanitária emitido esse fim de semana. O documento prevê, ainda, que as pessoas evitem aglomerações, beijos, abraços e apertos de mãos. Nos supermercados, deve ser mantida uma distância mínima entre os clientes, que só podem entrar em pequenos grupos, o que gera fila, irritação e desespero.

Esse clima de guerra, causado pela limitação da liberadade, pelo medo e pela possibilidade de um colapso no sistema de saúde, mostra que nenhum país está, de fato, preparado para lidar com uma emergência desse tipo. A reanimação de pacientes com insuficiência respiratória, um quadro grave provocado pela covid-19, está sendo discutida na Itália em termos de “é preciso escolher quem deve ser salvo”, visto que não há aparelhos suficientes para atendimento, caso haja um colapso.

Algo pode ser feito?

Essa atmosfera de pânico poderia ou pode ser evitada? O que se pode fazer para conter um vírus que já causou tantos prejuízos? Estaríamos lidando de forma equivocada com as epidemias?

O ecologista de doenças Peter Daszak, que previu o surto de covid-19, diz que sim.

O especialista, que estuda o surgimento de vírus que podem colapsar a saúde pública, afirmou à BBC que é preciso evitar as grandes epidemias, e não apenas reagir a elas. Isso pouparia vidas e dinheiro.

Daszak e outros especialistas haviam alertado a Organização Mundial da Saúde (OMS), há dois anos, sobre o risco de uma epidemia causada por um patógeno (naquele momento desconhecido) de origem animal que poderia rapidamente espalhar-se por todo o mundo, apresentando uma taxa de mortalidade capaz de gerar um pânico global.

Esse novo vírus, o Sars-Cov-2, que causa a doença covid-19, está aí desafiando cientistas e a população mundial. Em entrevista à BBC, Daszak explicou por que doenças desse tipo estão se tornando mais comuns. A razão seria a forma como estamos agindo sobre o meio ambiente, visto que cada vez mais estamos próximos da vida silvestre. Os animais selvagens carregam vírus e bactérias que podem ser letais para os seres humanos. A construção de estradas, o desmatamento, o comércio de animais silvestres são fatores que nos expõe a esses vírus desconhecidos, que causam essas novas doenças.

Daszak compara o que está acontecendo agora com outros momentos em que vírus originários de animais silvestres mataram milhões de pessoas no mundo, como foi o caso do HIV. O HIV é originário dos chimpanzés, que o transmitiram a caçadores. Na África, a tradição de alimentar-se de chimpanzés é antiga, entretanto, com o aumento populacional e com a circulação global de pessoas, o vírus se espalhou rapidamente. O ebola também é outro vírus de origem animal e o nipah, um vírus que vem do morcego, assim como a Sars e o coronavírus.

Investimento coletivo em ciência

Não há vacinas disponíveis para evitar as doenças que esses vírus causam, embora haja tratamento para elas. É preciso pensar a logo prazo para evitar as pandemias. Afinal, nenhuma empresa irá investir em vacina contra a Sars se a próxima epidemia será causada pelo coronavírus.

Por isso, Daszak advoga por uma vacina universal, que seja capaz de funcionar contra todas as cepas de coronavírus, os vírus ebola e da gripe. O grande desafio é que não são conhecidos todos os vírus que existem no mundo. Estima-se que haja cerca de 1,7 milhão de vírus oriundos da fauna silvestre que podem infectar seres humanos.

O trabalho da ciência é mapear geneticamente a maior quantidade de vírus possível para, então, produzir vacinas de caráter mais abrangente para um grupo de vírus. Entretanto, isso não é tão simples porque custa muito dinheiro, além de envolver uma rede internacional de pesquisadores.

Apesar de todas as dificuldades, o especialista alerta que, embora raras, as pandemias são devastadoras e, por isso, é fundamental um esforço coletivo para evitá-las.

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Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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