Decreto autoriza exploração de cavernas: retrocesso na legislação ambiental


Novo Decreto, nº 10.935, promulgado pelo Governo Federal em 12 de janeiro de 2022, dispõe sobre a proteção das cavidades naturais subterrâneas existentes no território nacional e, ao revogar o Decreto anterior, autoriza exploração de cavernas, mesmo as de relevância máxima, permitindo, inclusive, ações que causem impactos negativos irreversíveis, desde que liberados pelo órgão ambiental.

Não é preciso lembrar da importância que as cavidades naturais subterrâneas possuem, seja no aspecto histórico, ambiental, geológico, hídrico, turístico e até mesmo econômico.

Tanto assim que o Decreto anterior datava de 1990 (Decreto n°. 99.556), com algumas modificações em 2008 (Decreto 6.640/2008), para detalhar algumas classificações das cavernas, porém, ambos não autorizavam qualquer ação de impacto nessas áreas, principalmente as consideradas de relevância máxima.

Porém, não surpreendentemente, o governo do presidente Bolsonaro, que em reunião ministerial, por meio de seu então ministro do meio ambiente, já havia anunciado a intenção de “abrir a porteira”, revoga o Decreto mais restritivo e promulga outro autorizando o uso dessas áreas protegidas e até a ocorrência de impacto negativo irreversível.

O Decreto anterior, 6.640/2008, trouxe justamente as classificações de relevância das cavernas, em Máxima, Alta, Média ou Baixa, sendo inseridas a fim de complementar e contribuir com as análises de impactos ambientais e licenciamento de atividades possivelmente degradadoras.

As cavidades classificadas como de relevância máxima, não poderiam sofrer qualquer impacto, em hipótese alguma.

Já as cavidades classificadas como de relevância Média ou Baixa, poderiam ser suprimidas e compensadas através de financiamentos e ações voltadas para a conservação do patrimônio espeleológico.

Bens da União devem ser protegidos

Há que se lembrar que as cavernas subterrâneas, nos termos da Constituição Federal, são bens considerados da União e devem ser protegidos.

Agora, com o novo Decreto, as cavidades de relevância máxima poderão ser impactadas e até suprimida, desde que autorizadas por órgão ambiental e para atividade de interesse público.

Isso é muito grave, é um verdadeiro escárnio.

Pode-se dizer, por exemplo, que atividade de mineração é de interesse público e basta, assim, que um órgão ambiental autorize tal ação ou atividade para cavernas únicas simplesmente desaparecerem ou sofrerem impactos profundos e irreversíveis.

Para tentar minimizar esse impacto em cavernas de Máxima Relevância, o Decreto prevê: “assegurar a preservação de cavidade natural subterrânea com atributos ambientais similares àquela que sofreu o impacto e, preferencialmente, com grau de relevância máximo e de mesma litologia.”

Porém, a palavra preferência e não obrigatoriedade, abre caminho para que a imposição não seja seguida. Outro erro grave.

Retrocesso na legislação de proteção ambiental

Um exemplo prático do que esse erro pode causar, uma atividade pode impactar e até suprimir cavernas de Máxima relevância e “preferir” compensar com outras cavernas formadas de outra formação geológica, de menor relevância.

Segundo a ONG Observatório do Clima publicou em sua página no Twitter, outro exemplo de como o novo Decreto pode afetar esse tipo de bioma, é o que pode acontecer com a “caverna Buraco do Inferno, em São Desidério (BA), que abriga o maior lago subterrâneo do Brasil. A caverna vem impedindo a BR-135, uma estrada para carregar a soja que tb está destruindo o cerrado”.

Com o novo decreto esse tipo de atividade, uma rodovia, pode ser de interesse público e ser liberada pelo órgão ambiental, mesmo trazendo impactos irreversíveis na natureza.

É o combo da devastação.

Um verdadeiro retrocesso na legislação de proteção ambiental.

O antigo Decreto garantia a proteção das cavernas de Máxima relevância mantendo a conservação e proteção de áreas de minérios, principalmente ferro, áreas que também formam grandes reservatórios de água que abastecem inúmeras cidades, de forma interligada.

Fica evidente que a preservação de cavernas é a forma de preservar também os aquíferos, as nascentes, a biodiversidade, a geologia, a cultura e a história!!

Mas com esse novo Decreto fica tudo ameaçado.

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Juliane Isler

Juliane Isler, advogada, especialista em Gestão Ambiental, palestrante e atuante na Defesa dos Direitos da Mulher.


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