Mosquitos mutantes que combatem doenças: um negócio lucrativo e perigoso


Quem vive no Brasil sabe que todo ano há constantes campanhas governamentais para tentar controlar a proliferação de mosquitos, especialmente os que transmitem dengue e Zika vírus. Segundo a Organização Mundial da Saúde, somente em 2016 cerca de 1,5 milhão de pessoas contrairão Zika vírus no Brasil. E, para tentar combater este quadro alarmante, a empresa britânica Oxitec apontou como solução a criação de mosquitos geneticamente modificados capazes de eliminar os mosquitos selvagens que transmitem essas doenças.

Os mosquitos da Oxitec

Embora seja uma empresa britânica, a Oxitec já está trabalhando a todo vapor no Brasil. Instalou a primeira fábrica de mosquitos de grande escala na cidade de Piracicaba, no estado de São Paulo. Segundo Hadyn Parry, presidente da Oxitec, e fábrica de mosquitos geneticamente modificados em Piracicaba é a “primeira e a maior” do mundo.

“Esse é o único lugar onde temos uma fábrica como essa que pode ser usada como uma distribuidora para o Brasil”, relata Parry na inauguração da fábrica no Brasil, confirmando em seguida que planeja expandir os negócios. “Estamos conversando com vários municípios e estados”, complementa.

No entanto, mesmo sendo capaz de produzir cerca de 60 milhões de mosquitos por semana, a Oxitec ainda não tem autorização da Anvisa para vendê-los. “Ainda estamos esperando a aprovação da Anvisa, não temos data para isso, mas esperamos que seja em 2017”, diz Parry sem demonstrar qualquer preocupação.

Em termos práticos, os mosquitos criados pela Oxitec são geneticamente modificados para que suas crias morram antes de chegarem, à fase adulta. Isso significa que os mosquitos machos (que não picam) serão lançados na natureza para acasalarem com as fêmeas. Assim, os mosquitos oriundos do acasalamento serão geneticamente defeituosos, morrendo rapidamente, o que impediria a transmissão do Zika e outras doenças. Além disso, eles têm um marcador fluorescente para que possam ser identificados.

Para a Oxitec, os mosquitos modificados não implicam qualquer risco, demonstrando grande eficiência na eliminação dos mosquitos selvagens que transmitem as doenças. Em seus cinco estudos de campo realizados em 2011 e 2014 nas Ilhas Cayman, Panamá e também no estado da Bahia, ao menos 90% dos mosquitos selvagens de Aedes Aegypti foram eliminados após a inserção dos mosquitos geneticamente modificados, segundo a Oxitec. Mas restam muitas dúvidas e preocupações ambientais.

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Das causas e riscos

Uma das maiores bandeiras da empresa é especialmente combater o Zika vírus. Caso gestantes sejam contaminadas com o vírus desses mosquitos, seus bebês podem nascer com microcefalia, uma deformidade cerebral que faz com que as crianças tenham cabeças menores e problemas cognitivos. A tentativa da Oxitec é conseguir evitar casos como esses.

Mas, para ativistas e especialistas em meio ambiente, a ação da Oxitec parece desesperada e pode comprometer ainda mais o quadro de doenças por onde são liberados. “Não há garantias de que os mosquitos liberados também não carreguem a doença, ou seja, vão gerar milhões de mosquitos em todo o país, sem antes haver um estudo sério sobre o projeto. É uma insanidade, eu nunca vi tanta coisa errada em um só projeto” diz José Maria Ferraz, professor da Universidade Federal de São Carlos e também ex-membro da CTNBio, comissão responsável por liberar a instalação do projeto da Oxitec no Brasil.

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O país está sendo cobaia de um experimento nunca feito antes no mundo. Aprovamos esse projeto muito rápido, de forma irresponsável”, complementa Ferraz, ao alertar sobre os métodos escusos utilizados pelo CTNBio na liberação das atividades da Oxitec. Ao seu entender, os estudos realizados nas Ilhas Cayman e no Panamá apresentam resultados insatisfatórios e não compreendem os riscos a longo prazo desse mosquito geneticamente modificado na natureza.

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O grande problema parece se apresentar na forma em que o governo brasileiro encontrou para tentar resolver os casos de dengue e Zika. É sabido que o mosquito se desenvolve facilmente no Brasil, principalmente devido à falta de saneamento básico, questão ignorada pelas autoridades. Assim, tenta-se resolver o problema por um caminho perigoso e obscuro, colocando-se sob suspeita as verdadeiras intenções do governo brasileiro ao permitir acordos milionários com empresas como a Oxitec.

Os mosquitos começarão a ser distribuídos em Piracicaba em montantes de 10 milhões por semana, possivelmente a partir de 2017. Se der errado, o recall é impossível. Já pensou no tamanho do problema?

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Fonte foto capa: DiárioDeBiologia




Daia Florios

Cursou Ecologia na UNESP, formou-se em Direito pela UNIMEP. Estudante de Psicanálise. Fundadora e redatora-chefe de greenMe.


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