China sabia sobre os riscos da pandemia e escondeu informações importantes


Documentos e gravações da OMS mostram que a China sabia sobre os riscos da pandemia, e escondeu informações importantes sobre o novo coronavírus.

O mundo busca a verdade sobre a pandemia do coronavírus e muitas questões ainda não foram respondidas e outras surgem à medida que fatos veem à tona.

A respeitada agência de notícias Associated Press (AP), baseada em documentos e gravações da Organização Mundial da Saúde, OMS, revelou que o órgão da ONU, mesmo enquanto anunciava publicamente irrestrita colaboração do governo chinês, na verdade, internamente, estava decepcionado com a China porque as autoridades chinesas estavam atrasando significativamente informações além de omitir fatos relevantes sobre o coronavírus, mesmo tendo conhecimento dos grandes riscos e perigos que a doença poderia causar, afetando inclusive outros países.

Perguntas que não querem calar

Afinal, quando foi que a China descobriu a gravidade da doença? Por quanto tempo as autoridades mantiveram em segredo informações críticas e relevantes sobre o coronavírus que poderia ter impedido um surto global?

Segundo a longa reportagem da AP, no início, o governo chinês demorou, propositadamente, no mínimo, 06 dias para notificar oficialmente sobre o grande potencial danoso do vírus, permitindo que milhares de pessoas fossem infectadas nesse período sem qualquer informação.

Além disso, por duas semanas em janeiro, autoridades chinesas omitiram a ocorrência de novos casos, a informação sobre a possibilidade real de transmissão entre humanos e a sequência genética do vírus.

Os documentos revelam que, enquanto o país ainda minimizava os efeitos do vírus, especialistas de saúde já alertavam o governo chinês sobre a possibilidade de um surto sem precedentes.

Esses fatos são gravíssimos e colocam a China numa situação bem delicada.

Não é de hoje que os EUA acusam a China de ter omitido informações e vem exigindo da OMS uma investigação internacional independente sobre a origem do SARS-CoV-2 e o papel do país e da própria OMS desde o surgimento da doença.

O presidente norte-americano anunciou que os EUA iriam romper com a OMS e retirar qualquer financiamento à entidade.

Austrália, Suécia e outros países da Europa apoiam a realização de uma investigação internacional independente.

O que os documentos e gravações revelam

Os documentos e gravações da OMS obtidos pela AP revelam que o órgão tem uma versão interna diversa da oficial sobre o surgimento da doença, sobre o comportamento das autoridades chinesas e inclusive sobre sua própria atuação.

Sobre as omissões das autoridades chinesas, os documentos revelaram essencialmente quatro questões.

Retardamento em informar o sequenciamento do vírus

Mesmo depois de três diferentes laboratórios do governo chinês terem decodificado completamente o genoma do SARS-CoV-2, entre 27 de dezembro e 05 de janeiro, a informação somente foi liberada em 11 de janeiro, mais de uma semana depois e, isso só aconteceu porque um quarto laboratório, dessa vez particular, acabou publicando o sequenciamento num site de virologistas.

O governo chinês justificou que controles rígidos e concorrência no sistema de saúde pública seriam os “culpados” pelo atraso.

Mas na verdade, documentos da OMS revelaram que isso ocorreu por ordem do governo chinês, que enviou uma nota confidencial proibindo todos os seus laboratórios de pesquisa de publicarem a sequência genética do vírus, ou qualquer outra informação sobre ele, sem prévia autorização.

Documentos também revelam que um dia antes, no dia 5 de janeiro, o governo chinês tinha plena ciência do sequenciamento genético completo do vírus bem como já tinha sido alertado pelos cientistas chineses que “o vírus deve ser contagioso por vias respiratórias. Nós recomendamos tomar medidas preventivas em locais públicos”.

Mesmo diante de todas essas informações, as autoridades chinesas se calaram.

Falta de informação sobre infectados e sobre a doença

Os documentos também revelam que desde dezembro as autoridades chinesas tinham conhecimento sobre o surgimento de uma “gripe” que não tinha relação com os vírus conhecidos e que as pessoas não estavam melhorando com o tratamento padrão.

Em 30 de dezembro, as autoridades de saúde de Wuhan emitiram avisos internos alertando sobre uma pneumonia incomum que atingia grupos misteriosos de pacientes com febre e problemas respiratórios.

Mas essas informações não foram repassadas ao público, nem sequer como medida de prevenção.

A omissão teria começado desde 1º de janeiro, data em que a OMS solicitou oficialmente informações sobre o vírus às autoridades chinesas e receberam somente a informação sobre o número total de casos, 44, e nenhuma morte. E só.

Não foram informados sobre formas de transmissão, evolução da doença, quadro de pacientes, genealogia do vírus, nada.

Documentos mostram que em reuniões feitas na semana de 6 de janeiro, ficou constatado que a China não estava compartilhando dados suficientes para avaliar a eficácia com que o vírus se espalhou entre as pessoas ou o risco que isso representava para o resto do mundo, custando um tempo valioso.

Para a OMS, foi justamente esse período de duas semanas em janeiro que a China deixou de repassar as informações relevantes sobre a Covid-19, que seria o momento crucial para impedir que a proliferação da doença se tornasse pandemia.

Whuan não reportou novos casos e riscos de contágio

Outras omissões foram reveladas. Entre os dias 5 e 16 de janeiro, a cidade de Wuhan não reportou novos casos da doença, ainda que a transmissão e o contágio das pessoas estivessem em plena ascendência, e isso impediu, inclusive, que a epidemia fosse contida em sua fase inicial crítica.

As autoridades chinesas só revelaram que o vírus era transmissível entre pessoas, sua característica mais importante e maior causa de uma pandemia, apenas no dia 20 de janeiro, mesmo já tendo conhecimento desses fatos desde o dia 05 de janeiro, pelo menos.

Erros da OMS

As omissões do governo chinês sobre o novo coronavírus, levaram a OMS a erros.

Enquanto em dezembro os primeiros casos de gripe e pneumonia incomuns que não respondiam ao tratamento convencional vinham sendo notadas pelas autoridades de saúde chinesas, somente no dia 31 de dezembro, a OMS conheceu os casos pela primeira vez através de uma plataforma de código aberto que busca informações sobre surtos.

Imediatamente, no dia 1º de janeiro, a OMS solicitou oficialmente mais informações ao governo chinês que, de acordo com a lei internacional, têm de 24 a 48 horas para responder.

Em 05 de janeiro, no mesmo dia em que o governo chinês recebia o sequenciamento completo do vírus, e era comunicado pelos especialistas sobre os riscos do contágio e gravidade da doença, a OMS anunciava publicamente exatamente o contrário: não havia indícios de que o vírus poderia ser transmitido entre humanos.

A correção só viria no dia 11 do mesmo mês.

Os documentos revelam que, a partir daí, Michael Ryan, diretor executivo do programa de Emergências em Saúde da Organização Mundial da Saúde, disse que eles deveriam começar a pressionar a China e começar a fazer sua própria análise independente, utilizando a base de dados do governo chinês sobre a possibilidade do vírus se espalhar facilmente entre as pessoas.

A omissão do código genético, o ocultamento de casos e de informações foram a causa da OMS ter demorado tanto a reconhecer a situação emergencial da doença, declarando tardiamente a pandemia do novo coranavírus, apenas em 11 de março.

Os documentos e gravações revelam que, para a OMS, as omissões e atrasos na liberação das informações importantes sobre o vírus e sua forma de transmissão, foram as principais causas que impediram que tanto a entidade quanto as autoridades dos outros países tomassem medidas de prevenção para tentar impedir a disseminação da doença, permitindo que o vírus se espalhasse e chegasse na situação atual de pandemia global.

Como chegamos no surto?

Durante essas duas primeiras semanas de janeiro, na qual o governo chinês já tinha todas as informações mais relevantes sobre o vírus, seu sequenciamento genético, gravidade e formas de contágio, as autoridades de Hubei realizaram duas importantes reuniões partidárias em Wuhan, capital da província, e convidou mais de 40 mil famílias para participarem de um banquete em massa, na tentativa de estabelecer um recorde de participação.

Estava pronto o gatilho do surto.

Ainda segundo a reportagem da AP, 14 de janeiro foi uma data fundamental quanto à “falta” de uma resposta da China ao vírus.

Isso porque, um relatório parcial do governo informava que as autoridades de saúde da província de Hubei foram informadas pelo chefe da Comissão Nacional de Saúde da China que “todas as localidades deveriam se preparar e responder a uma pandemia”.

No entanto, totalmente ao contrário do relatório, as autoridades chinesas foram orientadas a manter “um entendimento sóbrio da situação” e mesmo tendo conhecimento do risco de transmissão e propagação alto, o vírus continuou sendo minimizado em público.

Em 19 de janeiro, cinco dias após ter pleno conhecimento da gravidade da situação, a Comissão de Saúde de Wuhan disse que o surto era controlável, evitável e não contagioso.

No dia seguinte, porém, o público foi avisado de que a transmissão entre pessoas estava ocorrendo e três dias depois, 22, Wuhan foi colocada em isolamento total.

Mas já era tarde demais, o vírus já tinha se espalhado por toda a China, infectando dezenas de milhares de pessoas.

Em 30 de janeiro, 28 dias depois do sequenciamento completo do vírus pelo governo chinês, a OMS declarou uma emergência global.

Esse período foi o suficiente a disseminar o vírus por vários países no mundo, num surto que se espalhou por um fator de 100 a 200 vezes, de acordo com dados retrospectivos de infecção chinesa.

O papel da OMS

Ao longo de janeiro, a Organização Mundial da Saúde elogiou publicamente a China pelo que chamou de uma resposta rápida ao novo coronavírus. A OMS agradeceu ao governo chinês por compartilhar o mapa genético do vírus “imediatamente” e disse que o trabalho e compromisso chinês com a transparência eram “muito impressionantes”.

Mas o que levou a OMS a ter essa atitude?

Segundo a reportagem da AP apurou, “as autoridades da OMS estavam elogiando a China em público porque queriam obter mais informações do governo”. Era uma estratégia de negociação.

Com essa revelação, a agência de notícias AP mostra que a OMS não compactuou com o governo chinês, ao contrário do que sustenta o Presidente Donald Trump, que anunciou que o país rompia com a OMS e que iria sair da organização.

https://www.greenme.com.br/viver/costume-e-sociedade/44915-oms-sob-suspeita-de-complo-com-a-china/

Na verdade, os documentos mostram que a OMS agiu com cautela para não colocar em risco a pouca colaboração que estava recebendo.

Embora a lei internacional obrigue os países a relatar à OMS informações que possam ter impacto na saúde pública, a agência da ONU não possui poderes para obrigar esse cumprimento de forma impositiva nem tampouco tem o poder para realizar uma investigação independentemente de epidemias nos países, necessita de cooperação dos Estados membros.

Alguns especialistas que foram consultados pela reportagem, observaram que, é possível que se a OMS tivesse sido mais “firme” com a China, poderia ter desencadeado uma situação muito pior de não obter nenhuma informação.

Em comunicado, a OMS afirmou que “nossa liderança e equipe trabalharam dia e noite em conformidade com as regras e regulamentos da organização para apoiar e compartilhar informações com todos os Estados Membros igualmente, e se engajar em conversas francas e diretas com governos de todos os níveis”.

Resposta chinesa

Enquanto isso, o presidente chinês Xi Jinping prometeu arrecadar 2 bilhões de dólares nos próximos dois anos para combater o coronavírus, dizendo que a China sempre forneceu informações à OMS e ao mundo “da maneira mais oportuna” e “Aqueles que acusam a China de não ser transparente, são injustos e insultam os grandes sacrifícios feitos pelo povo chinês.”

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Juliane Isler

Juliane Isler, advogada, especialista em Gestão Ambiental, palestrante e atuante na Defesa dos Direitos da Mulher.


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