Campanha médica busca evitar “overdose” de exames


Você já teve a impressão de ter feito exames médicos desnecessários?

As sociedades médicas brasileiras de Cardiologia e de Medicina da Família estão trazendo para o Brasil uma campanha que tem o objetivo de esclarecer sobre os riscos da “epidemia de diagnósticos”.

A campanha “Choosing Wisely” (Escolhendo com sabedoria) foi iniciada nos Estados Unidos, em 2012, para alertar sobre a “epidemia de diagnósticos”, que é o excesso de exames que poderia levar a uma “overdose” de tratamentos desnecessários e, até mesmo, maléficos em alguns casos.

Como nós, pacientes, podemos saber se um exame é ou não necessário?

Infelizmente, não há uma resposta satisfatória para essa pergunta, que gera discussão na comunidade médica e dúvida nos pacientes. “Com exames mais sofisticados, os diagnósticos e tratamentos aumentaram. Mas a mortalidade não caiu para nenhum tipo de câncer, nem para doenças cardiovasculares, segundo pesquisas. Certos procedimentos têm efeitos colaterais piores que algumas formas das doenças”, explica André Volschan, coordenador do Centro de Estudos do Hospital Pró-Cardíaco, no Rio de Janeiro.

Entusiasta da campanha, Volschan afirma que os procedimentos só têm justificativa quando podem aumentar a expectativa ou a qualidade de vida do paciente. “A cada mulher salva da morte por câncer de mama, muitas outras sofrem biópsias, que são procedimentos invasivos. O mesmo ocorre com a próstata. Intervenções devem ser bem avaliadas, pois levam a problemas permanentes, como impotência sexual.”

Mas a opinião do médico não é consensual. O presidente da Sociedade Brasileira de Patologia, Clóvis Klock, é contrário à opinião de Volschan. “Temos que trabalhar com o máximo possível de prevenção, especialmente a do câncer. Falsos positivos são evitados com investigações posteriores mais complexas, como biópsias”. Ele fala da importância dos exames exemplificando que, “através de técnicas mais precisas de diagnóstico e cirurgia, cura-se muito mais câncer que há 30 anos”.

Para evitar discordâncias entre os médicos, a campanha recebeu o apoio da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que acredita ser o lado positivo dela estimular os médicos a refletirem sobre quais procedimentos podem ser evitados.

Na lista da Sociedade Brasileira de Cardiologia, uma intervenção, que movimenta um mercado de US$ 10 bilhões por ano, deve ser evitada: a colocação de “stents” em pacientes assintomáticos (“stents” são pequenos tubos que abrem vasos entupidos por placas de gordura no coração).

Segundo o cardiologista Luís Cláudio Correia, do Hospital São Rafael, em Salvador (BA), “o procedimento é invasivo, obriga a pessoa a ficar usando remédios e não previne infartos, mesmo em quem tem grande placa. O “stent” só é indicado para melhorar a qualidade de vida de quem tem dor em repouso e outras situações específicas, como no pós-infarto”.

Correia explica que 50% das intervenções coronárias nos Estados Unidos são inadequadas ou incertas. “O excesso é uma forma que alguns profissionais têm de parecerem competentes. É também uma questão mercantilista. Vivemos de procedimentos realizados. Às vezes, a remuneração por exame é baixa, então muitos são pedidos, o que é uma distorção”, critica. Para o cardiologista, os médicos precisam ser mais científicos e reconhecerem que não têm controle sobre o destino, mas que podem “reduzir a probabilidade de eventos adversos”.

O clínico-geral e coordenador do Programa de Medicina Interna Hospitalar do Hospital Divina Providência, em Porto Alegre (RS), Guilherme Barcellos, diz que “o trabalho agora é envolver sociedades de outras especialidades, para que façam suas listas”.

O pesquisador da Fiocruz, Josué Laguardia, comenta que está em desenvolvimento uma página do “Choosing Wisely Brasil”, onde serão fornecidas informações sobre o uso inadequado de procedimentos diagnósticos.

Existem certos mitos de que solicitar exames é uma garantia de que a consulta valeu a pena. Por isso, a campanha não deve ser entendida como uma recomendação de abandonar a medicina preventiva, conforme explica Volschan. “O que buscamos é o uso dos exames de forma racional. Medicina não é assinar pedidos de ressonância.”

O angiologista e cirurgião vascular Eduardo Fávero diz que “as pessoas sempre pedem exames. É mais fácil, porém errado, preencher uma guia em dez segundos do que explicar, em dez minutos, por que determinado teste não é indicado”. Segundo ele, o ideal é que médico e paciente conversem e cheguem a um consenso sobre qual procedimento é mais adequado para o caso. “Há muitas doenças que podem ser acompanhadas por meio de ultrassonografia em vez das tomografias, para as quais se toma contrastes, que são tóxicos para os rins”, explica Fávero.

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Fonte foto: bbc




Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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