Cuidado! O Youtube está cheio de vídeos com desinformação sobre aquecimento global


Aquecimento global existe? Uma coisa é certa: se o aquecimento global fosse uma farsa, a gente se sentiria aliviado e nos desresponsabilizaríamos de nossas atitudes passadas e as para o futuro. Muita gente não quer mudar seu estilo de vida e consumo e opta pela dúvida, escolhe o caminho de não pensar no coletivo – como se fosse possível excluir-se do todo.

Estamos vivendo a era das fake news. Na política, o recurso da desinformação foi a tônica de várias campanhas eleitorais, como ficou comprovado nos Estados Unidos e aqui no Brasil. Mas a difamação e a tentativa de minar a credibilidade alheia não têm como alvo apenas pessoas, mas, também, ideias e estudos científicos.

É o que mostra uma matéria da BBC News Brasil acerca de uma investigação realizada em seis países (Alemanha, Brasil, Espanha, Estados Unidos, França e Reino Unido) no Youtube, rede a partir da qual se estaria impulsionando vídeos com conteúdos desinformativos e até falsos sobre as mudanças climáticas e o aquecimento global. O número de visualizações dos vídeos é considerável: 21,1 milhões de acessos.

Um estudo

A plataforma de campanhas Avaaz produziu um relatório que analisa vários vídeos sugeridos a usuários que buscam no Youtube expressões em inglês como global warming (aquecimento global), climate change (mudança climática) e climate manipulation (manipulação climática). As análises foram feitas de agosto a dezembro de 2019.

Cerca de 16% dos vídeos sugeridos na barra lateral do Youtube quando o usuário buscava o termo “aquecimento global” indicavam conteúdos com informações falsas, as quais foram checadas pela equipe da Avaaz por comparação com informações divulgadas por organismos especializados sobre a temática, como o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a Nasa, a Agência Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (Noaa), bem como a produção científica recente.

Os conteúdos dos vídeos afirmam não existir comprovação de que esteja ocorrendo mudança climática e de que haja responsabilidade humana sobre isso. Os vídeos estimulam, ainda, a inércia, já que é dito que não há muito o que fazer para reduzir as consequências do aquecimento global.

De acordo com o relatório:

“Descobrimos que o YouTube está levando milhões de pessoas a assistirem vídeos de desinformação sobre o clima todos os dias. Eles não estão apenas sendo postados no YouTube e vistos de maneira orgânica por audiências interessadas no tema — o algoritmo de recomendações do YouTube está promovendo esses vídeos gratuitamente, levando desinformação a quem não seria exposto a eles de outra forma”.

Interesses financeiros

Que tipo de interesse poderia estar por trás desses vídeos?

Ainda é difícil saber a motivação clara para a produção dos vídeos, mas com tantas visualizações os responsáveis pelas postagens devem estar tendo muito lucro. A Avaaz identificou 108 empresas com anúncios vinculados aos vídeos. Empresas globais e até ONGs que lutam pela causa climática tiveram seus nomes relacionados a tais conteúdos.

Embora contraditório que essas ONGs tivessem associação com canais que são contrários à causa que elas defendem, é preciso investigar melhor essa combinação algorítmica. O alarmante é que os algoritmos determinam os vídeos a que nós assistimos no Youtube, visto que 70% dos conteúdos são acessados por recomendação da plataforma.

A coordenadora de campanhas da Avaaz, Flora Rebello Arduini, alerta para o alcance potencial de vídeos desinformativos, uma vez que 2 bilhões de pessoas são usuários ativos do Youtube.

“O problema é que você está alimentando informações incorretas sobre algo que já é comprovadamente verdade [a mudança climática]. Cria-se essa bolha de desinformação, e em um tema importante como esse, que pode influenciar em quem você vai votar na próxima eleição, por exemplo, além de ter um efeito devastador no futuro”, esclarece Arduini.

Procurado pela BBC, o Youtube disse que investe para evitar conteúdos que violam as regras da empresa (de propriedade da Google) que veiculam informações perigosas e não fidedignas. Já o Greenpeace, uma das ONGs que foram associadas aos vídeos com conteúdos falsos, defendeu-se exigindo que empresas de tecnologia e redes sociais criem mecanismos mais eficientes para evitar a propagação e monetização desse tipo de conteúdo.

Como evitar informações falsas?

Dentre as medidas recomendadas pela Avaaz ao Youtube estão:

  • limpar seu algoritmo para que deixe de promover vídeos que contenham desinformação ou informações falsas;
  • desmonetizar esses conteúdos (ou seja, deixar de incluir neles anúncios de companhias e ONGs);
  • corrigir os erros, a partir da checagem de dados, e informar os usuários sobre conteúdos falsos ou enganosos.

Mentiras também no Whatsapp

Nós, usuários, não apenas do Youtube mas de qualquer outro canal de comunicação, devemos checar as informações que nos chegam – algo que parece tem sido pouco feito pelos brasileiros. Um estudo recente realizado pelo Congresso Nacional revelou que para 79% dos entrevistados o principal meio de informação é o Whatsapp, informa o Conversa Afiada.

O Whatsapp é um aplicativo de mensagem, e não um meio de comunicação no qual trabalham profissionais que produzem notícias cuja fonte é checada. Ele é um canal pelo qual estas podem circular, mas é preciso checar a origem delas e quem são os atores que as produzem.

Além do Whatsapp, os outros canais utilizados pelos brasileiros para se informarem são: televisão aberta (50%), YouTube (49%), Facebook (44%), sites de notícias (38%), Instagram (30%) e rádio (22%). Apenas 8% dos entrevistados leem jornais impressos.

Assim como em relação ao aquecimento global ações coletivas e individuais devem ser tomadas para reduzir as mudanças climáticas em curso, a forma como a informação/desinformação circula é de responsabilidade de empresas de tecnologia, anunciantes e, também, dos usuários. Negar a realidade pode ser um mecanismo de blindagem para viver em uma bolha, mas ele é frágil, assim como a própria bolha, que um dia sempre estoura.

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Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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