Criticado e elogiado: o que disseram sobre o discurso de Bolsonaro na abertura da 74ª Assembleia da ONU


O presidente Jair Bolsonaro abriu a 74ª Assembleia Geral da ONU, em Nova York (EUA), na qual discursou por cerca de 30 minutos.

Bolsonaro disse que o seu governo tem o compromisso de preservação do meio ambiente e com o desenvolvimento sustentável, e que foi alvo de ataques sensacionalistas da imprensa internacional em relação às queimadas na Amazônia.

Justificando que o clima e os ventos, nesta época do ano, contribuíram para os focos de fogo, Bolsonaro ainda responsabilizou os povos indígenas por realizarem queimadas criminosas. Entretanto, como divulgado pelo G1, dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) mostram que 2019 foi o ano com mais focos de queimadas no país desde 2012.

O presidente do Brasil, sem mencionar diretamente o nome de Emmanuel Macron, criticou o presidente francês ao dizer que ele tem um “espírito colonialista”: “É uma falácia dizer que a Amazônia é um patrimônio da humanidade”, disse Bolsonaro diante de uma plateia com cerca de 150 chefes de Estado.

Outro alvo de suas críticas foi o cacique Raoni, que esteve recentemente em viagem pela Europa para conversar com estadistas europeus. O mandatário brasileiro garantiu que em seu governo não haverá demarcação de terras indígenas.

“A visão de um líder indígena não representa a de todos os índios brasileiros. Muitas vezes alguns desses líderes, como o cacique Raoni, são usados como peça de manobra por governos estrangeiros na sua guerra informacional para avançar seus interesses na Amazônia. Infelizmente, algumas pessoas, de dentro e de fora do Brasil, apoiadas em ONGs, teimam em tratar e manter nossos índios como verdadeiros homens das cavernas”, discursou Bolsonaro.

A veracidade dos pontos

A veracidade de alguns pontos tocados por Bolsonaro ao longo do seu discurso foram checados pela Agência Lupa, que atestou que muitos deles são falsos ou exagerados, como: “(…) O Brasil usa apenas 8% do seu território para a produção de alimentos”. Segundo averiguado pela Lupa, com base em dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o Brasil usa 235,9 milhões de hectares para a agropecuária, o que representa 28,2% da área terrestre do Brasil. A maior parte desse território é utilizada para pela atividade pecuarista: 172,6 milhões hectares, ou seja, 20,6% do total.

Reação internacional

A expectativa sobre o discurso de Bolsonaro era muito grande em todo o mundo. Mas o tom adotado pelo presidente brasileiro não agradou a plateia. As reações de especialistas em meio ambiente, lideranças políticas e jornalistas foi bastante negativa. O tweet abaixo é de Anthony Boadle, correspondente da Reuters.

O governador do Amapá, Waldez Góes (PDT), que conversou com a delegação francesa, disse que é preciso que Bolsonaro modere o tom de suas falas.

“É impossível se avançar na solução dos problemas sem manter as relações diplomáticas”, afirmou Góes à BBC.

O estado do Amapá e os demais que fazem parte do Consórcio da Amazônia Legal, região com área florestal amazônica, estão estudando manter conversas diretamente com as autoridades alemãs e norueguesas para tentar reestabelecer os depósitos de quase R$ 300 milhões que ambos os países destinariam para o fundo Amazônia, cortados em julho após questionamentos sobre a destinação dos recursos pelo governo federal, informa ainda a BBC.

A ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, comentou, em sua conta no Twitter, que o discurso de Bolsonaro “tem um potencial enorme de produzir um efeito ainda mais nefasto para a imagem do Brasil no exterior: uma vergonha globalizada”.

Até o liberal Jorge Dória (PSDB-SP) criticou a fala do presidente na ONU: “inadequada e inoportuna”, além de ter faltado “bom senso” ao presidente. “[O discurso] não teve referências que pudessem trazer respeitabilidade e confiança no Brasil no plano ambiental, econômico ou político”, concluiu.

Já o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, cumprimentou o brasileiro parabenizando-o por seu “grande discurso”. Outro estadista que parabenizou Bolsonaro foi o presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari. Mas, no geral, o discurso de Bolsonaro foi mal recebido pelos membros da Assembleia.

ONGs ambientalistas

As organizações ambientalistas também, em coro, criticaram a postura de Bolsonaro na Assembleia da ONU. O coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace no Brasil, Márcio Astrini, disse que o discurso foi uma “farsa”: “Na realidade, Bolsonaro promove o desmonte da área socioambiental, negocia terras indígenas com mineradoras estrangeiras e enfraquece o combate aos crimes florestais”, afirmou à Exame.

A organização WWF analisou que Bolsonaro “ao quebrar a histórica liderança do país na área ambiental frente a outras nações, a sua postura acentua a preocupação internacional e dos mercados sobre a capacidade do Brasil para proteger a Amazônia e contribuir com a redução dos efeitos das mudanças climáticas”.

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O presidente Bolsonaro repetiu ao mundo o que vem dizendo aqui desde a campanha eleitoral. Em seu discurso na abertura da Assembleia Geral da ONU, reafirmou sua política anti-indigenista e anti-preservacionista. “Quero deixar claro: o Brasil não vai aumentar para 20% sua área já demarcada como terra indígena, como alguns chefes de estado gostariam que acontecesse”, disse ele. Em seguida, citou duas vezes o nome do Cacique Raoni, de quem disse ser manipulado por interesses internacionais. Além de erros conceituais, como dizer que os povos tradicionais ainda viviam na Pré-História, demonstrou desconhecimento sobre os números concretos também: afirmou que o Brasil tem 220 povos, quando são 305, e que são 77 que vivem em isolamento, quando são 114. Além disso, desacreditou a imprensa e os estudos científicos que apontam para o aumento acelerado do desmatamento na Amazônia, e atacou países como França e Alemanha. Bolsonaro começou seu discurso celebrando o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, tão desejado pelo agronegócio brasileiro. Suas palavras seguintes, porém, podem tê-lo inviabilizado. Ou seja, não foi bom nem para seus aliados. Em nome de quê? Foto: @sergio_ranalli Saiba mais: https://tinyurl.com/yxcugqf2 #GreveGlobalPeloClima #MarchaPeloClima #GlobalClimateStrike #ActOnClimate #MudançasClimáticas #ClimateChange #MelhoraEsseClima #MexeuComÍndioMexeuComClima #FridaysForFuture #FridaysForFutureBrasil #CadaGotaConta #UmaGotaNoOceano

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Embora haja quem o defenda e quem tenha considerado seu discurso impecável, Bolsonaro decepcionou muitos brasileiros, e o mundo, no tocante às políticas destinadas à segurança da preservação ambiental.

Vamos ter que lutar para impedir que mais danos ao meio ambiente ocorram durante a sua gestão no governo federal. E que possamos contar com a ajuda internacional para garantir a preservação da nossa biodiversidade.

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Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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