Bolsonaro usa dados ambientais de gestão passada em discurso na Cúpula do Clima


O discurso do presidente Jair Bolsonaro na Cúpula do Clima 2021 não surpreendeu: com distorção de dados e promessas pouco ambiciosas, o Brasil da gestão Bolsonaro-Salles não tinha mesmo nada de bom para apresentar ao mundo.

Metas ambientais

Bolsonaro foi o 19º líder a discursar na Cúpula de Líderes sobre o Clima. O presidente se comprometeu a levar o Brasil a alcançar a neutralidade climática até 2020 reduzindo drasticamente as emissões de gases causadores do efeito estufa e adotando medidas ambientais compensatórias. Também se comprometeu com o desmatamento zero no país para os próximos nove anos.

O tom de Bolsonaro e da imprensa internacional

Entretanto, é difícil acreditar nas promessas de Bolsonaro se olharmos para o histórico ambiental de seu governo nos últimos dois anos. Por isso mesmo, a imprensa internacional reagiu com ceticismo à fala do presidente brasileiro.

A BBC divulgou o tom dos principais veículos de imprensa sobre o discurso de Bolsonaro. O jornal estadunidense “The Washington Post” destacou o seguinte:

“Bolsonaro ofereceu um tom mais conciliatório à administração de Biden nesta quinta-feira. […] As promessas do líder brasileiro foram recebidas com grande ceticismo por muitos especialistas, que observam que as ações anteriores [de Bolsonaro] para proteger a floresta resultaram em pouco progresso e o desmatamento aumentou desde que ele assumiu o cargo em 2019.”

Já o “Financial Times” foi ainda mais duro:

“Muitos permanecem profundamente céticos sobre se Bolsonaro está genuinamente comprometido com a proteção do meio ambiente. Alguns analistas, porém, apontam que o país latino-americano ficou isolado no assunto desde a saída de Donald Trump da Casa Branca.”

É verdade que o tom de Bolsonaro sobre a questão climática mudou desde que Joe Biden assumiu a presidência dos Estados Unidos, o que fez aumentar ainda mais a pressão internacional sobre o Brasil para atingir as metas do Acordo de Paris.

Some-se isso a sanha do governo brasileiro em receber fundos milionários para a conservação da Amazônia, o que vem sendo discutido a portas fechadas entre representantes do governo dos Estados Unidos e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

Para receber esse montante vultoso, Bolsonaro valeu-se de distorções em seu discurso, que foi checado por vários órgãos de imprensa. Segundo a Piauí, a agência Lupa junto o Facebook.eco analisaram as “pérolas” jogadas por Bolsonaro para os líderes mundiais, como se estivesse falando para os seus apoiadores:

“Ao discutirmos mudanças no clima, não podemos esquecer a causa maior do problema: a queima de combustíveis fósseis ao longo dos últimos dois séculos”.

A principal variável de longa duração para a mudança climática é o aumento da concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera, que não para de aumentar desde o fim do século XIX. Embora a principal causa do problema seja a queima de combustíveis fósseis, o desmatamento e a agropecuária intensiva são fatores que também atuam para esse crescimento, segundo estudos da NASA, da World Wide Fund for Nature (WWF) e da União Europeia.

“O Brasil participou com menos de 1% das emissões históricas de gases de efeito estufa, mesmo sendo uma das maiores economias do mundo”.

O Brasil contribuiu para 4,4% do aquecimento global, considerados os gases causadores do efeito estufa e o uso da terra, segundo um estudo do físico Luiz Gylvan Meira Filho, publicado em 2005.

Um outro estudo, publicado por pesquisadores canadenses em 2014, mostra que o Brasil foi o quarto país que mais colaborou com o aumento na temperatura média do planeta, ficando atrás apenas de Estados Unidos, China e Rússia. A causa disso foi a aceleração do desmatamento na Amazônia nas décadas de 1970 e 1980.

“Como resultado [da redução do desmatamento], somente nos últimos 15 anos, evitamos a emissão de mais de 7,8 bilhões de toneladas de carbono na atmosfera”.

Bolsonaro usa dados de governos anteriores para maquiar a má atuação do seu. A redução do desmatamento na Amazônia a partir de 2006 ajudou a evitar a emissão de cerca de 7,8 bilhões de toneladas de gás carbônico para a atmosfera. Em 2019 e 2020, o desmatamento cresceu de 10,1 mil km² para 11,1 mil km² na região, contribuindo para romper o ciclo brasileiro de diminuição de emissões pela via do desmatamento.

“No campo, promovemos uma revolução verde a partir da ciência e inovação. Produzimos mais utilizando menos recursos, o que faz da nossa agricultura uma das mais sustentáveis do planeta”.

A gestão de Bolsonaro foi a que mais liberou agrotóxicos e pesticidas no Brasil e retirou verbas da agricultura familiar. Estamos longe de ser um modelo de agricultura sustentável para o mundo.

No Índice de Sustentabilidade Alimentar, o Brasil ocupa a 51ª posição. Os indicadores considerados nesse ranking são: água, uso da terra (incluindo biodiversidade e capital humano) e emissões de gases do efeito estufa. O nosso setor agrícola é um dos principais setores a afundar o Brasil, que apresenta péssimos índices em agrotóxicos, manejo de fertilizantes, desigualdade e clima.

Dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) apontam o Brasil como o terceiro país com maior uso de pesticidas no mundo e o coloca entre os 30 países que mais utilizam agrotóxico por área plantada.

Promessas em vão?

Mais uma vez passamos vergonha diante do mundo todo e ficamos com o sentimento de descrédito sobre o cumprimento das metas ambientais apresentadas pelo país que tem a maior biodiversidade do planeta e deveria, portanto, ser o primeiro a empenhar-se em atingi-las.

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Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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