Por que a Anvisa defende o uso do glifosato, a estrela dos agrotóxicos?


Em menos de 50 dias de governo, o Brasil liberou cerca de sessenta agrotóxicos, uma média de um por dia, conforme noticiado pelo GreenMe via Agência Pública.

Dentre os agrotóxicos mais usados no país e no mundo está o glifosato, que este ano teve mais três novos registros autorizados no Brasil. Vale lembrar que o glifosato é um dos tóxicos mais vendidos e usados na agricultura brasileira, devido ao seu alto poder de eficácia contra pragas em lavouras de soja, milho e algodão.

Mas existem muitas evidências sobre os problemas provocados pelo glifosato, e a cobrança da sociedade civil sobre o seu uso praticamente indiscriminado nas plantações brasileiras levou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a anunciar esta semana o resultado de uma reavaliação toxicológica da substância, como informa a BBC News Brasil.

Glifosato provoca câncer?

O parecer técnico da Anvisa certifica o uso do glifosato no país, já que considera não haver evidências científicas de que ele provoque câncer, mutações ou má formação em fetos.

O órgão afirma ainda que, embora não haja riscos de danos à saúde por contaminação pela ingestão de água ou alimentos com o glifosato, algumas restrições ao tóxico – como a proibição da venda para uso doméstico de forma concentrada – devem ser observadas.

A Anvisa abrirá pelo período de 90 dias uma consulta pública para a sociedade se manifestar sobre a regulação do herbicida, antes que a decisão final do órgão seja anunciada.

O que é o glifosato?

O glifosato é o principal ingrediente ativo de diversos agrotóxicos usados em plantações e jardins. Existem 110 produtos com a substância sendo comercializados em todo o Brasil e produzidos por 29 empresas diferentes. Em 2017, aproximadamente 173 mil toneladas de produtos com glifosato foram usadas no país, segundo a Anvisa.

Desde 2008, a substância vem sendo reavaliada no Brasil a partir da análise de estudos científicos, relatórios de organismos internacionais, dados oficiais de monitoramento em água e de intoxicações e estudos das empresas que registraram a substância.

Recomendações

A Anvisa propõe que o glifosato não seja mais vendido em sua forma concentrada para uso doméstico, e sim que ele seja comercializado já diluído na concentração recomendada para uso em jardins. A justificativa do órgão é de que a preparação doméstica do produto pode causar irritação ocular.

Outra restrição proposta é que a exposição diária ao tóxico seja de, no máximo, 0,1 ml por kg de peso corporal para o trabalhador que faz a aplicação e está em contato com a substância diariamente. Para a população em geral, o limite seria de de 0,5 ml por kg de peso corporal.

Quando uma pessoa entra em contato com uma alta concentração de glifosato pode ter intoxicação aguda. Em geral, quem sofre esse risco são os trabalhadores que aplicam a substância. Por isso, o órgão recomenda que haja capacitação para os aplicadores do herbicida. Entretanto, sabemos que essa realidade está longe de acontecer nas fazendas brasileiras, logo, além de recomendar, o governo federal deveria, também, fiscalizar.

Controvérsias

Em 2015, a Agência Internacional para Pesquisa sobre Câncer (Iarc) da Organização Mundial de Saúde (OMS), após analisar centenas de estudos sobre o glifosato, concluiu que ele é “provavelmente cancerígeno” para humanos.

A Comissão Europeia autorizou o uso do glifosato na Europa até 2022, ano em que fará uma reavaliação da substância. Entretanto, a pressão dos agricultores é grande. O presidente da França, Emmanuel Macron, queria acabar com o uso do glifosato no país até 2021, mas precisou recuar após protestos de fazendeiros e agricultores. “Não é mais viável, vai matar nossa agricultura”, explicou Macron.

No Sri Lanka, a venda do glifosato foi proibida, após um estudo que apontou o agrotóxico como responsável pelo número crescente de casos da doença renal crônica no país.

Enquanto as agências reguladoras dizem “sim” ao glifosato, parte da comunidade científica e ambientalistas dizem “não.” De acordo com o agrônomo Luiz Claudio Meirelles, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz:

“Se você olha como algumas substâncias foram tratadas historicamente, percebe semelhanças. O DDT (pesticida muito usado na segunda metade do século passado), por exemplo. Quando começou a se descobrir seus efeitos cancerígenos, quem tinha interesse econômico fez de tudo para negar. Mas a ciência independente foi avançando, comprovando que os malefícios eram verdadeiros, e não havia mais como negar. Hoje, o DDT é proibido mundialmente. O glifosato é o DDT de hoje, vai passar pelo mesmo processo”.

Já os ambientalistas estão preocupados, além dos riscos à saúde, com os danos ambientais provocados pelo glifosato. Um estudo recente, publicado revista Proceedings of the National Academy of Sciences, concluiu que, quando insetos são expostos à substância, ela afeta o micribioma intestinal desses animais e diminuiu sua capacidade de combater infecções.

Doenças causadas pelo glifosato

Não é apenas o câncer que pode ser provocado pelo glifosato. Outras doenças podem estar relacionadas ao contato com o herbicida, como problemas renais e de tireoide, inflamações intestinais, deficiências nutricionais, dificuldades digestivas, crises de arrotos, gases e estufamento abdominal, além de possíveis alterações no sistema reprodutivo, que levam à infertilidade.

É preciso que a sociedade esteja vigilante aos processos de regulação de agrotóxicos e se informe sobre os males que estes podem causar para a saúde e para o meio ambiente. Em geral, as agências reguladoras de governos federais sofrem a pressão do lobby do agronegócio e, por isso, aprovam a liberação de substâncias com pouco estudo comprovado sobre os seus efeitos a longo prazo. Então, somos nós quem temos que nos informar e exigir mais rigor técnico nas avaliações.

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Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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