Chão em chamas: a luta dos colombianos pelo direito de viver


A América Latina vem sendo há séculos o solo de experiências para o capitalismo. E, agora, a Colômbia vem lutando para que ele não a apunhale com um golpe ainda mais fatal do que o novo coronavírus.

Desde o seu experimento inicial com a expansão colonial para a América, o capitalismo tem imposto uma agenda de genocídios, exploração ambiental, escravidão e destruição das mais variadas em solo americano.

Neoliberalismo

Em sua versão neoliberal, o capitalismo tem tentado sobreviver impondo novamente à América Latina sua face perversa. Argentina com Mauricio Macri, Brasil com Jair Bolsonaro e a economia de Paulo Guedes, o golpe na Bolívia são todas experiências mais ou menos extremas de tentativa de implantação da retirada de direitos que leva ao aumento das desigualdades sociais em um região onde, no desde o início do século XX, vinha se fortalecendo uma agenda progressista.

O que se passa na Colômbia?

O que está acontecendo na Colômbia é um ato de resistência ao neoliberalismo. Apesar de o país ter altas taxas de mortalidade por Covid-19, os colombianos estão com mais medo do que possa acontecer no futuro do que com o presente.

A Colômbia é o quarto país da América com o maior número de mortes por coronavírus, depois de Estados Unidos, Brasil e México, tendo apenas 3,5% de sua população vacinada, segundo o Alice News. Não bastasse isso, o país se soma ao Brasil e outros que se negam a apoiar a quebra de patentes de vacinas.

No campo social, em 2020, 42,5% da população estava na linha da pobreza e 15,1% na linha de pobreza extrema. O país ainda registra outros tristes índices: calcula-se que entre 700 e 1.100 defensores de direitos humanos tenham sido assassinados.

Histórico de violências

Para quem não se lembra, a Colômbia passou vários anos com áreas sob o domínio das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, conhecidas como FARC, que, em 2016, foram desmobilizadas por um acordo de paz, mas acabou se reintegrando no partido político Força Alternativa Revolucionária do Comum. À época, cerca de 7 mil membros da antiga guerrilha entregaram mais de 8 mil armas à Organização das Nações Unidas (ONU), informa a BBC.

As antigas zonas das FARC são dominadas, hoje, por milícias com diferentes interesses (tráfico de drogas, mineração ilegal etc.), mas que têm em comum o uso violento da força e o controle sobre a população civil – algo bastante parecido com o que acontece no Rio de Janeiro e está se espalhando pelo Brasil.

Desde que as FARC se dissolveram, a Colômbia tem sido presidida por um governo de direita que se opôs ao acordo de paz e, agora, está tentando aprovar uma reforma tributária com a justificativa de arrecadar dinheiro para conter a crise provocada pela pandemia.

Na verdade, a reforma tributária vai jogar os colombianos na rua da miséria. Como o Brasil, a Colômbia precisa de uma reforma fiscal, mas que seja justa, o que significa tributar mais quem ganha mais, e não os trabalhadores assalariados, informais e profissionais liberais.

Segundo o Banco Mundial, a Colômbia é um dos países mais desiguais da América Latina. Grande parte disso se deve à uma política fiscal completamente inadequada que ajuda a concentrar a riqueza nas mãos de uns poucos. Isso gera, como sabemos, o abismo da desigualdade por haver menos desenvolvimento socioeconômico.

Manifestações

Nos últimos anos, os colombianos têm se organizado e saído às ruas, mas, em 2021, parece que chegaram ao estopim. Desde 28 de abril, as marchas pelo país se avolumam de pessoas contra a reforma tributária do presidente Ivan Duque Márquez, que tem usado as forças policiais para reprimir violentamente os manifestantes.

Várias organizações de direitos humanos estão divulgando o que está acontecendo na Colômbia, visto que os meios de comunicação tradicionais da maioria dos países têm se calado sobre o assunto. Entre 28 de abril e 5 de maio, calcula-se que houve 1708 casos de violência policial, 381 vítimas de violência física por parte da polícia, 31 mortes, 1180 prisões arbitrárias de manifestantes, 239 intervenções violentas, 31 vítimas de agressão nos olhos, 110 casos de disparos de armas de fogo pela polícia e 10 vítimas de violência sexual. Também há registros na Defensoria Pública de 87 queixas por desaparições durante os protestos na Greve Geral no dia 28 de abril.

A esta altura, talvez você não esteja achando esse cenário tão distante do nosso. Mas a escalada de terror no país vizinho só vem aumentando: o presidente Duque Márquez aumentou a militarização na Colômbia e, desde o dia 1º de maio, pelas redes sociais os colombianos têm mostrado ao mundo como o seu país se converteu em um Estado de exceção nos moldes ditatoriais, visto que a polícia realiza disparos contra manifestantes pacíficos. Vários artistas latino-americanos, como Jorge Drexler e Fito Páez, têm usado as suas redes sociais para denunciar a escalada de violência e autoritarismo na Colômbia.

Lutar pelo futuro que queremos

Os colombianos certamente devem estar com medo do risco de morte e adoecimento provocado pela Covid-19, mas eles também temem – e talvez mais ainda – que não haja mais um futuro para eles quando a pandemia acabar.

Por isso, o povo colombiano está ocupando as ruas do país para lutar para que suas vidas tenham dignidade e justiça, nada menos do que podemos almejar.

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Fonte e foto: nuso.org




Gisella Meneguelli

É doutora em Estudos de Linguagem, já foi professora de português e espanhol, adora ler e escrever, interessa-se pela temática ambiental e, por isso, escreve para o greenMe desde 2015.


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