Espinosa e seus Princípios de Desapego, Vida Simples, Deus e Religião


Neste conteúdo vamos falar sobre Baruch Spinoza, em português, Benedito de Espinosa, considerado um importante filósofo racionalista que viveu no século XVII e tinha uma visão à frente de seu tempo, a ponto de contestar verdades religiosas consideradas absolutas pelas principais religiões de sua época.

Sua visão de que Deus É em tudo, confrontou os princípios religiosos das Instituições Judaico – Cristãs que ditavam a moral e as tradições na sociedade, na qual estava inserido.

Para saber mais sobre Espinosa e sua filosofia, veremos os seguintes assuntos:

  1. Quem foi Espinosa
  2. A filosofia de Espinosa
  3. Temas que Espinosa abordou em sua filosofia
  4. Principais Obras de Espinosa
  5. Deus segundo Espinosa
  6. Vídeo com a mensagem de Anand Dilvar, comumente, atribuída à Espinosa
  7. Deus É em tudo

1. Quem foi Espinosa

Antes do nascimento de Espinosa, os pais dele tiveram que fugir da perseguição religiosa da Igreja Católica, mudando-se para Amsterdã, na Holanda.

Baruch de Espinosa nasceu em Amsterdã, Holanda, em 24 de novembro de 1632. Filho de uma família judaica-portuguesa (judeus que constituíram pátria em Portugal), Espinosa era chamado por seus pais pelo seu nome em português, Bento.

Os primeiros estudos religiosos de Espinosa, iniciaram quando ele era ainda criança.

Ele estudava, profundamente, o Talmude e o Antigo Testamento da Bíblia, além de aprender a língua hebraica, na sinagoga, da qual fazia parte.

Nessa época, ele já era muito questionador.

2. A Filosofia de Espinosa

Espinosa, desde jovem, abordava livremente seus pensamentos sobre religião com seus amigos.

Para Espinosa era absurdo acreditar em um Deus, separado do mundo real, agindo como um déspota e juiz. Ele não identificava nos textos sagrados embasamento para essa visão que se tinha de Deus.

Os questionamentos e opiniões de Espinosa desagradaram os líderes religiosos de sua época. Espinosa recebeu muitas advertências e repressões destes líderes mas, por insistir em manter seus pontos de vista foi acusado de ateísmo e excomungado em 1656.

Por conta desse acontecimento, trocou seu nome hebraico pelo latino: Benedictus de Espinosa, e deixou de conviver no seio da comunidade judaica, da qual fazia parte.

Passou a se dedicar mais aos seus estudos de filosofia, além do latim e grego. Dentre os filósofos que Espinosa se aprofundou, em seus estudos estão: Descartes, Platão, Aristóteles, Epicuro, Cícero, Sêneca, os filósofos medievais, entre outros. Nesta etapa de sua vida, Espinosa começou a redigir o Tratado de Correção do Intelecto.

Um fato violento marcou a vida de Espinosa, um judeu fanático o agrediu à golpes de facas, por considerá-lo uma vergonha para a comunidade judaica. Aterrorizado com o ato e temendo por sua vida, Espinosa saiu de Amsterdã e foi para Rijinsburg, em Leyden, Holanda do Sul.

Nesta fase, Espinosa escreveu seu Breve Tratado e os primeiros trechos de seu principal livro: Ética. Para poder se sustentar, passou a trabalhar como polidor de lentes de telescópios e microscópios, ofício que aprendera no tempo em que frequentava a sinagoga e o exerceu até o final de sua existência.

Espinosa tinha como princípio de vida a máxima de Epicuro: “Viver os prazeres simples”.

A forma de viver de Espinosa tinha os seguintes princípios:

  • desapego de riquezas e bens materiais;
  • existência sem ostentação;
  • moderação nos prazeres;
  • desenvolvimento baseado na reflexão e no conhecimento.

Estes princípios eram vistos por ele não como um fim em si mesmos, mas como um meio de elevar seu pensamento.

O asceticismo (autocontrole e disciplina) que envolveu o comportamento de Espinosa, não tinha por finalidade a preparação para uma outra vida ou para obtenção de recompensa divina.

Para Espinosa essa conduta era um meio de elevar e expandir o pensamento filosófico, com ampliação da visão e compreensão da Vida, trazendo um estado de felicidade e contentamento.

Espinosa fazia amigos por onde passava, devido às suas conversas agradáveis e suas ideias.

Novamente, Espinosa sentiu necessidade de mudar para outra cidade, da Holanda do Sul, indo para Voorburg, onde continuou a trabalhar e escrever.

A ignorância do conhecimento religioso o inquietava, por isso resolveu escrever o Tratado Teológico Político. O objetivo desta obra era mostrar as limitações do pensamento religioso e como era utilizado para criar obediência cega e servil.

Espinosa publicou seus livros, de forma anônima, como precaução, para manter a tranquilidade e autonomia para continuar escrevendo suas ideias e pensamentos, sem correr o risco de ser perseguido.

Por ter ficado bem conhecido em Voorberg e muitas pessoas buscarem ter contato com ele, Espinosa resolveu mudar, no ano de 1670, para Haia, ainda na Holanda do Sul. Nesta cidade pequena e agradável, Espinosa passou o resto de sua existência e concluiu sua obra de maior importância, Ética, fundamentada no conhecimento dos geômetras (matemáticos, especialistas em geometria). Pelo conteúdo impactante desta obra, Espinosa determinou que sua publicação ocorresse, de forma póstuma (após sua morte).

Espinosa recebeu convite para dar aulas na Universidade de Heidelberg porém o recusou, pois previa que não teria liberdade de falar sobre suas ideias.

Ele queria viver livremente, tendo autonomia de vida e pensamento.

Espinosa não tinha medo da pobreza, o que ele realmente temia eram o esbanjamento, a ostentação e a fama.

Sua mente estava focada em outros objetivos:

  • Como viver bem?
  • De que forma se livrar do medo?
  • Como viver, verdadeiramente, em liberdade?
  • Qual o melhor maneira de exercer a politica?

A filosofia de Espinosa tinha como principais fundamentos:

  • a virtude e a potência;
  • os afetos e a alegria;
  • Deus e a Razão.

Ele se opôs, com sua filosofia:

  • ao racionalismo de Descartes;
  • aos dogmas e mandamentos religiosos;
  • ao despotismo (poder absoluto) dos governos;
  • ao moralismo religioso dos seguidores das principais instituições religiosas.

O pequeno grupo de amigos de Espinosa contribuiu para a difusão das suas ideias.

Até a sua morte, Espinosa viveu uma existência modesta, sendo fiel e verdadeiro com sua forma de pensar e viver.

Espinosa morreu aos 44 anos, em 21/02/1677, talvez por consequência do pó de vidro que inalou no exercício de seu ofício, como polidor de lentes de microscópio e telescópio.

Sua obra Ética foi publicada, postumamente, porém, proibida por todas as autoridades religiosas e políticas da época.

O Tratado Político, outra obra dele, permaneceu inacabada.

Espinosa faz parte do grupo de filósofos que representam uma ameaça para o status quo da sociedade. A potência das ideias e pensamentos de Espinosa nos leva a desconstrução de muitos condicionamentos e valores, que até então, tínhamos como certos e verdadeiros.

A vida de Espinosa é um reflexo de suas obras. Pensamento e ação se projetaram, de forma coerente na existência deste filósofo.

3. Temas abordados por Espinosa em sua filosofia

  • A Potência do Ser
  • Ciência dos Afetos
  • Cinco remédios dos Afetos
  • Cinco virtudes do homem livre
  • Virtude e Beatitude
  • O que pode o corpo
  • Desejo
  • Ética: demonstrada à maneira dos geômetras
  • Deus e a Natureza
  • Relação mente e corpo
  • Origem e Natureza dos Afetos
  • Servidão Humana e a força dos afetos
  • Liberdade
  • Três Gêneros do Conhecimento – Primeiro: Imagem/Superstição; Segundo: Razão/Relação; Terceiro: Intuição

4. Principais Obras de Espinosa

spinoza 2

Publicados “post mortem” (após sua morte):

Escritos em latim:

– Ética demonstrada à maneira dos geômetras (Ethica Ordine Geometrico Demonstrata) Iniciado em Rijnsburg e finalizado em Haia em 1675.

Conteúdo:

Primeira parte: Deus

Segunda parte: A natureza e a Origem da Mente.

Terceira parte: A Origem e a Natureza dos Afetos.

Quarta parte: A Servidão Humana ou a Força dos Afetos.

Quinta parte: A Potência do Intelecto ou a Liberdade Humana.

– Tratado Político (Tractatus Politicus), depois incluído na Ética, 1677

– Tratado sobre o Cálculo Algébrico do Arco-Íris, 1687

– Tratado sobre o Cálculo das Probabilidades, 1687

– Compêndio de Gramática da Língua Hebraica, inacabado.

Escritos em holandês:

– Breve tratado de Deus, do homem e do seu bem-estar (Korte Verhandeling van Deus, de Mensch en deszelvs Welstand).

Foi um esboço da Ética -1660

Publicados em vida:

– Tratado sobre a Reforma do Entendimento (De Intellectus Emendatione)

– Tratado para Emendar o Intelecto (Editora Unicamp);

– Tratado da Reforma da Inteligência (Editora Martin Fontes);

– Tratado da Reforma do Entendimento (Editora Escala);

– Tratado sobre a Correção do Intelecto (Acrópolis Filosofia), 1662.

– Princípios da Filosofia de Descartes, publicado junto com seu apêndice Pensamentos Metafísicos. Nesta obra, Espinosa revela seu distanciamento das várias teses de Descartes, 1663.

– Tratado Teológico-político (Tractatus Theologico-Politicus), 1670.

5. Deus segundo Espinosa

Espinosa, em sua principal obra, Ética, dedicou toda a primeira parte contida nela, para definir Deus e sua Essência.

A natureza de Deus, para Espinosa, é muito diferente das definições religiosas judaico-cristãs.

Diferentemente do que muitas pessoas pensam, Espinosa não era ateu, pois em sua concepção, a Presença de Deus está em Substância contida em tudo.

“Deus é causa imanente, e não transitiva, de todas as coisas” – Espinosa, Ética I, proposição-18

Para Espinosa, Deus não está separado do mundo, sentado em seu trono dando ordens aos seus representantes divinos e julgando as pessoas.

Deus, para Espinosa não é uma entidade que criou o mundo e passou a observar à distância, para decidir o destino final.

As instituições religiosas criaram essa imagem antropomórfica (humanizada) de Deus, como ferramenta de controle e obediência de seus seguidores.

Para Espinosa, Deus é o homem, o mundo, a Natureza e o Universo, enfim, Deus É tudo!

Segundo esse princípio, se quiser ver Deus, veja a Natureza ! Deus não está separado, ELE é a causa interior de tudo que existe. A causa imanente da essência e da existência de tudo, que age em nós. Deus é o mundo por pura necessidade e expressão de sua essência . “Deus não produz porque quer, mas porque é” (Deleuze, Espinosa e o Problema da Expressão, proposição-69).

O ser, a existência, é puro ato da afirmação de Deus.

O infinito, em todas as suas manifestações é o que constitui a Essência de Deus.

Deus é a origem de si mesmo. O mundo existe pela capacidade de Deus existir nesse mundo. A partir de Deus existem infinitas coisas. A Substância de Deus é infinita e possui infinitos atributos. Os atributos são expressões e manifestações de Deus. A substância infinita de Deus se manifesta de várias formas, nós humanos só conhecemos duas delas: extensão (matéria) e pensamento.

Como Deus é infinito, tudo existe dentro dele.

Dessa forma, somos parte da natureza de Deus.

O ser humano é um modo da substância divina, limitado por extensão e tempo. Em cada atributo encontramos seu modo.

Cada modo depende do um atributo correspondente para existir. Uma pedra (modo) depende do atributo extensão (elemento, matéria ou corpo). A extensão, por sua vez, não depende da pedra para existir. Cada um de nós é um modo, em uma complexidade maior que a pedra. A essência é um grau de potência, que é atuante, produzindo efeitos e manifestações decorrentes dela. Deus é, ao mesmo tempo, as leis naturais, a matéria e energia que sustenta e se manifesta em cada ser e elemento da Natureza.

A potência divina se afirma em cada ser e elemento da Criação. Somos o infinito através de nossa finitude. O finito se manifesta de forma contínua no Infinito.

“Tudo o que existe, existe em Deus, e sem Deus, nada pode existir, nem ser concebido” – Espinosa, Ética I, proposição-15

Deus é a potência do ser, ELE é a essência de nossa capacidade de pensar e agir.

ELE É a potência de criação e manutenção do universo, que age de forma natural e espontânea.

“Deus age exclusivamente pelas leis de sua natureza e sem ser coagido por ninguém” – Espinosa, Ética I, proposição- 17

Para ampliar todos esses conceitos assistam este vídeo do Canal SaBer em FoCo-SBFC.

Através dessa visão de Espinosa, podemos concluir que somos perfeitos, porque somos a afirmação da Potência de Deus, segundo nossa natureza.

Dentro de nossa natureza finita, podemos encontrar outras naturezas que se harmonizam com a nossa, aumentado nossa potência.

Espinosa com sua definição de Deus põe fim ao Ser transcendente, que as religiões criaram para representar Deus. Vivemos, agimos e pensamos em Deus, aqui e agora!

Quando vivemos, de acordo com a Potência que É em nós, nos alinhamos com as leis de Deus. Somos parte de Deus, portanto somos causa e através desta afirmação, somos ato criador, manifestando os efeitos na Criação.

6. Vídeo

Há anos, a bela mensagem contida neste vídeo, e também em outros vídeos e conteúdos escritos que circulam na Internet, vêm sendo creditados à Espinosa.

O motivo disso, talvez seja porque o sentido dessa mensagem se aproxima da visão realista e natural que este filósofo tinha de Deus.

Veja essa mensagem na expressiva interpretação de Flavio Siqueira e que, de certa maneira, vem de encontro com o que vimos neste conteúdo.

7. Deus É em tudo

Einstein, quando perguntado se acreditava em Deus, respondeu:

“Acredito no Deus de Espinosa, que se revela por si mesmo na harmonia de tudo o que existe”

Deus pela premissa de Espinosa É em tudo, porque:

  • É a Substância da realidade, a causa de si mesmo e de todas as coisas, ao mesmo tempo.
  • Existe por si só e produz toda a realidade.
  • A natureza é expressão de Deus!
  • O mundo é produção de Deus.
  • Todos os seres, elementos e objetos são os “modos” de Deus contidos no atributo “extensão”.
  • Todas as ideias são os “modos” de Deus contidos no atributo “pensamento”.
  • Seres, elementos, objetos ou modos são de natureza naturada (totalidade dos modos produzidos pelos atributos), enquanto a Única Substância, ou Deus, é Natureza Naturante (Potência de causa inesgotável).

Os “modos” são finitos.

Deus é de Natureza Infinita e Eterna.

Agora, após essa abordagem dá para cada um de nós, em seu MODO e ATRIBUTO reconhecer a Potência de DEUS em si e em tudo ?

Fica para tua REFLEXÃO!

Fonte fotos: Wikipedia




Deise Aur

Professora, alfabetizadora, formada em História pela Universidade Santa Cecília, tem o blog A Vida nos Fala e escreve para greenMe desde 2017.


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