34 mil animais mortos no Chile por falta de água. Mudança climática é apenas uma das explicações


Uma seca assola o Chile há cerca de dez anos. Criadores de gado e agricultores já migram para outras regiões do país em busca de condições climáticas mais favoráveis e o Ministério da Agricultura chileno contabiliza 34 mil animais mortos até o momento.

Embora o país, historicamente, tenha atravessado outros períodos de estiagem intensa, 2019 vem quebrando recordes. Na capital Santiago, choveu muito pouco este ano: 81 milímetros. Em Valparaíso, a segunda cidade mais importante do Chile, o volume de chuva foi cerca de um quinto da média histórica.

Os especialistas dão explicações variadas para a situação, que vão do mau uso do solo ao longo dos anos – e a sua consequente degradação – passando, inevitavelmente, pelos efeitos das mudanças climáticas. Alguns especulam sobre as tendências naturais do território. Afinal, lá se encontra o deserto mais seco do mundo, o Atacama – e dizem que ele anda querendo se expandir para o sul.

Fato é que, como detalhou a reportagem de Fernanda Paúl, da BBC Mundo, 56 municípios, em cinco regiões do Chile, estão sob um decreto de escassez de água, e mais de 100 outras localidades foram declaradas zonas de emergência agrícola.

Os criadores estão vendendo o gado por preços muito inferiores aos praticados em condições normais de temperatura e pressão, porque, dada a escassez, ficou mais caro alimentá-los. Os que não têm mais condições de mantê-los, passam os animais adiante como podem, para que eles, muitas vezes já fracos e desnutridos, não morram.

De acordo com reportagem, o Ministério da Agricultura chileno contabiliza 470 mil cabras, 170 mil bois e vacas e 150 mil ovelhas em “más condições”. Até o momento, 34 mil animais morreram devido à escassez de água.

As abelhas, tão necessárias para o equilíbrio dos ecossistemas também já deixaram a região, exemplificando algumas das reações em cadeia provocadas pela seca: sem água, muitas plantas não florescem. Sem elas, não há alimento para as abelhas.

“Quem deixar suas abelhas aqui vai simplesmente perdê-las”, declarou Andres à BBC. Ele é um apicultor que, depois de 25 anos em Quilpué – região de Valparaíso –, decidiu mudar suas 260 colmeias para Linares, uma cidade localizada no centro-sul do Chile.

Não se trata de um caso isolado. A movimentação de pequenos produtores, buscando regiões mais favoráveis no país, já é uma realidade: um estudo da Organização das Nações Unidas (ONU) aponta que 15% da sua população (cerca de 5 mil pessoas) emigraram por razões climáticas.

Há várias explicações para a mudança no regime de chuvas no país, mas existe concordância em relação às consequências do processo de erosão do solo. À BBC, Francisco Meza, pesquisador do Centro de Mudança Global da Universidade Católica do Chile, destacou o manuseio inadequado da terra, com exploração excessiva e ausência de medidas de restauração, como um fator determinante.

Na visão de Meza, mesmo o avanço do Deserto do Atacama poderia ser compreendido por esse viés:

“Não é que as areias estejam se movendo para o sul […] Quando a terra é degradada dessa maneira, a riqueza das espécies é empobrecida, então você perde a diversidade e o ecossistema é enfraquecido”, explicou.

O ministro da agricultura do Chile, Antonio Walker, sem deixar de reconhecer a realidade da degradação dos solos e a importância de políticas públicas para mitigar o problema, ele alerta também para os efeitos das mudanças climáticas:

“As mudanças climáticas chegaram para ficar e temos que agir […] a desertificação é uma realidade e o grande desafio agora é como lidar com esses solos degradados e transformá-los em matéria orgânica e de alto carbono […] Não construímos a infraestrutura de irrigação para tirar proveito da água. Precisamos fazer reservatórios, uma nova institucionalidade da água, tratar esgotos, entre outras ações”, declarou.

Que esse caso tão próximo do Brasil sirva de alerta. Sabe-se bem que somos privilegiados como nenhum outro país do planeta em termos de recursos naturais, mas eles são finitos. 2019 também vem estabelecendo recordes por estas bandas, com queimadas na Amazônia, óleo espalhado no litoral nordestino e rios sendo contaminados de diversas formas. A conta, um dia, vai chegar.

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Gisele Maia

Jornalista e mestre em Ciência da Religião. Tem 18 anos de experiência em produção de conteúdo multimídia. Coordenou diversos projetos de Educação, Meio Ambiente e Divulgação Científica.


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