Huni Kuni: os caminhos da jiboia, um game brasileiro


Huni Kuin: os Caminhos da Jiboia é o nome do novo game que virá ao mundo digital em abril. Este é um projeto de antropólogos, programadores visuais e membros do povo Kaxinawá, ou huni kuin, que quer dizer, “pessoa verdadeira”, “homens verdadeiros” ou “gente com costumes conhecidos”.

Este é um game inovador, com sons da floresta e cantos indígenas, um jogo que leva o participante a se interessar pela realidade indígena e, para jogar, ele, o jogador, terá de aprender muitas coisas sobre essa cultura. O conhecimento dos rituais ancestrais, dos animais, das plantas e dos espíritos é fundamental para que se possa jogar. O jogador também poderá aprender, se quiser, o idioma hatxã kuin, que é falado no jogo.

A história deste jogo também é diferente, nada de guerra, armas, tiroteio ou violência urbana. A história que norteia Huni Kuin é uma representação da mitologia Kaxinawá. Dois irmãos gêmeos, o caçador, a artesã, foram concebidos, em sonhos, pela jiboia Yube e dela herdaram poderes especiais. Uma série de obstáculos se apresentam aos dois protagonistas que os devem vencer. Se vencerem se tornarão respectivamente pajé e mestra dos desenhos. A história da jiboia Yube pertence ao mito fundados dos Kaxinawá e também, do uso da ayauaska, Nixi Pae, por esta etnia. A arte gráfica kaxinawá, que é atributo exclusivamente feminino, representa animais, homens e a natureza, também representa mitos relacionados com a formação deste povo. Leia mais aqui, se estiver interessado em aprofundar estes conhecimentos.

Como é que se faz um pajé na etnia Kaxinawá?

“Pajé dá e tira vida. Para virar pajé, vai sozinho para a mata e amarra o corpo todo com envira. Deita numa encruzilhada com os braços e as pernas abertos. Primeiro vêm as borboletas da noite, os husu, elas cobrem seu corpo todinho. Vem os yuxin que comem os husu até chegar a tua cabeça. Aí você o abraça com força. Ele se transforma em murmuru, que tem espinho. Se você tiver força e não solta, o murmuru vai se transformar em cobra que se enrola no teu corpo. Você agüenta, ele se transforma em onça. Você continua segurando. E assim vai, até que você segura o nada. Você venceu a prova e daí fala, aí você explica que quer receber muka e ele te dá”.

O jogo foi idealizado por Guilherme Meneses, antropólogo da Universidade de São Paulo – USP e, a equipe conta com um programador, artista digital e game designer, outros antropólogos. Mas, na produção tiveram participação ativa 45 Kaxinawás das 32 aldeias existentes no Acre.

“Decidimos com eles [indígenas] o roteiro e as histórias. Eles desenharam os protótipos, gravaram as músicas e os efeitos sonoros. Os pajés narraram as histórias”, informou Meneses, que viu no projeto uma ferramenta contemporânea para explorar e divulgar a cultura dos Kaxinawá.

Quem são os Kaxinawás?

Os Kaxinawá são hoje, segundo o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010, 7,5 mil em todo o Brasil dos quais, mais de 3 mil estão no Acre. No Peru, onde também vive esta etnia, são 2.419 indivíduos (dado de 2007). Kaxinawá quer dizer “gente que tem o hábito de caminhar a noite“, gente morcego ou gente canibal, também.

Este povo vive na floresta tropical ao pé dos Andes, no Peru, até a fronteira com o Brasil, onde entra pelo estado do Acre e sul do Amazonas. Essa área corresponde ao Alto Juruá e Purus e o Vale do Javari.

O idioma que falam os kaxinawá é o hatxã kuin que quer dizer “língua verdadeira” do tronco linguístico Pano, comum a várias culturas da região.

E como é o jogo, afinal?

Em cinco fases o Huni Kuin aborda mitos tradicionais da etnia Kaxinawá e, em cada fase, o jogador é guiado, pelo pajé, no aprendizado necessário, num profundo mergulho nos rituais e desenhos típicos kaxinawá. O jogo, que é falado em português e hatxã kuin, também terá legendas em inglês e espanhol.

“A jiboia é um animal encantado dentro do universo Kaxinawá e dentro da primeira história é o personagem principal”, destacou Meneses.

Todo o trabalho de criação e pesquisa levou quase três anos. Foi uma rica experiência de convívio na aldeia São Joaquim, no Centro de Memórias, durante quatro meses, onde foram oferecidas oficinas de audiovisual e produção de conteúdo. No contato com os indígenas ficou evidente que o jogo também tem elementos que ajudam o fortalecimento do povo Kaxinawá e a abertura de seus horizontes para universos tão distantes de sua realidade como a tecnologia digital, que interessou principalmente aos mais jovens. O audiovisual foi todo realizado pelos kaxinawá que participaram das oficinas – cinematografia, história, desenhos, costumes, tudo obra indígena.

“Minha ideia original era que gamers e outros interessados tivessem uma visão de como é uma aldeia, o mundo indígena, os mitos e que isso ajudasse a derrubar certos preconceitos que até hoje existem por falta de informação da população sobre os indígenas”, acrescentou o antropólogo.

“A própria questão da tecnologia é uma transformação na aldeia. É uma demanda deles entrar em contato com nossas cidades, de conseguir trabalho, projetos e visibilidade dentro do cenário nacional”, acrescentou Guilherme Meneses.

A produção do vídeo e a experiência com o jogo foi um fator de aproximação dos jovens Kaxinawá com os mais velhos e com a sua cultura. Este fato ficou evidente, principalmente, no trabalho desenvolvido na aldeia Isaka Kaxinawá, contou um dos coordenadores de trabalho: “Fortaleceu a sabedoria dos nossos velhos, porque o velho sabe muito da tradição e temos de aproveitá-los. Eles nos ajudam a pensar nosso futuro, o do nosso filho e do nosso neto.”

Na primeira semana de abril será o lançamento de O Caminho da Jiboia nas comunidades indígenas que participaram do projeto. A partir de seu lançamento, estará disponível na internet para download gratuito.

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Fonte: agenciabrasil.ebc.com.br




Redação greenMe

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