Dilma sanciona Marco da Biodiversidade com vetos


A presidente Dilma Rousseff sancionou com vetos, ontem, 20 de maio, o PL 7.735/2014, agora Lei 13.120/2015, chamada Novo Marco Legal da Biodiversidade. O polêmico projeto regulamenta os acessos ao patrimônio genético brasileiro e ao conhecimento tradicional à ele associado. Aguardamos a publicação da nova lei, para fazermos as contas dos vetos.

O que é Acesso ao patrimônio genético?

É poder realizar atividade sobre o patrimônio genético, isolando, identificando ou utilizando informações de origem genética, moléculas ou substâncias provenientes de seres vivos e de extratos obtidos destes, para fins de pesquisa, desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção, para uso industrial ou de outra natureza. Em outras palavras, é ter acesso à nossa biodiversidade (plantas, animais) e ao conhecimento dos povos tradicionais: índios, quilombolas, agricultores familiares, para fabricação de remédios, cosméticos, produtos alimentícios, etc.

Histórico:

O projeto de lei PL 7.735/2014 que regulamenta o inciso II dos §§ 1º e 4º do art. 225 da Constituição Federal, além de outros artigos do Decreto que promulgou a Convenção sobre Diversidade Biológica, fora apresentado pelo Poder Executivo em 24/06/2014.

O projeto passou pelo Senado Federal onde recebeu emendas consideradas positivas por associações de povos e entidades indígenas, quilombolas, agricultores familiares e organizações defensoras do meio ambiente.

Tais organizações e associações, 142 no total, assinaram um Pedido de Veto ao referido PL, alegando principalmente a falta de devida participação dos povos interessados na elaboração do projeto.

Leia também: Dilma: veta o PL da Biodiversidade!

Os Vetos

O Pedido era de veto total ao PL, mas enumerava e argumentava quais artigos deveriam ser vetados no caso em que a presidente decidisse sancionar o PL com vetos.

Quais artigos deveriam ser vetados

Segundo as associações e organizações que defendem a biodiversidade e os povos que tutelam e detêm conhecimento tradicional sobre ela, os artigos que deveriam ser vetados eram:

1. art.9°,§ 1°, III

É um artigo que estabelece que o acesso ao conhecimento tradicional associado (ou seja, o acesso à informação sobre as práticas individual ou coletiva dos povos das florestas sobre o nosso patrimônio genético, para fins de pesquisa ou desenvolvimento tecnológico, para aplicação industrial, comercial ou de qualquer outra natureza) deve haver um consentimento previamente informado.

Até aí muito bom se não fosse o inciso III, que estabelece que tal consentimento seria dado por órgão oficial competente.

A única competência para permitir o acesso a tais conhecimentos tradicionais não poderiam vir de “órgãos oficiais competentes”, senão somente de quem os detêm, ou seja, dos povos tradicionais das florestas.

2. art. 9°,§ 3°

O artigo estabelece que todo e qualquer conhecimento tradicional relacionado ao patrimônio genético de variedades tradicionais locais, crioula ou de raças localmente adaptadas, para atividades agrícolas, apesar de conterem conhecimento tradicional, serão sempre de origem não identificável.

O artigo ignora a própria diversidade dos povos brasileiros.

3. art.10°, V

O artigo fala sobre o direito de usar e comercializar produtos que contenham patrimônio genético ou de conhecimento tradicional associado, mas condiciona tal direito à duas leis, o que causaria incompatibilidade de direitos, colididos por diferentes disposições contidas nas diferentes legislações.

4. art 17, §10°

Trata sobre a obrigação de repartição dos benefícios obtidos da exploração econômica de produtos ou materiais oriundos do acesso ao patrimônio genéticos de espécies ou do conhecimento tradicional associado, mas isenta de obrigação aqueles que comprovarem que obtiveram benefícios antes de 29 de junho de 2000.

5. art 19, §4°

Como serão feitas as repartições dos benefícios: de formas monetária e não monetárias. E quem fará a repartição? o usuário.

Não existem razões para que o usuário dos conhecimentos e do patrimônio genético decida como repartir os benefícios dos bens conservados pelos povos indígenas, tradicionais e pelos agricultores familiares.

6. art. 21

Para fomentar competitividade, o governo poderia celebrar um acordo entre interessados a fim de reduzir o valor da repartição de benefícios monetários para 0,1%.

O artigo permitiria que, em nome da competitividade, se violassem os direitos dos detentores dos conhecimentos tradicionais brasileiros.

7. art. 29, §3°

Quem fiscalizaria as infrações contra os patrimônio genético e de conhecimento tradicional? IBAMA, Marinha – Ministério da Defesa e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

As competências seriam convergentes, os interesses entre os órgãos são de naturezas diferentes.

8. art 41. §4°

O usuário que tivesse iniciado o processo de regularização antes da data de entrada em vigor do PL, poderia, a seu critério, repartir os benefícios da exploração de acordo com outra lei ( a MP 2.186/16)

O artigo daria a possibilidade do usuário se beneficiar do melhor regime, colocando o provedor dos bens tradicionais em situação de desvantagem.

9. art 44

“Ficam remitidas as indenizações civis relacionadas a patrimônio genético ou a conhecimento tradicional associado das quais a União seja credora.”

A União não pode se redimir de reparação civil decorrente de danos contra a biodiversidade.

Agora é aguardar a publicação da nova lei, para fazermos as contas dos vetos.




Daia Florios

Cursou Ecologia na UNESP, formou-se em Direito pela UNIMEP. Estudante de Psicanálise. Fundadora e redatora-chefe de greenMe.


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